domingo, 10 de fevereiro de 2008

Marcação no escanteio: estilos e preferências

É consenso no meio do futebol que as jogadas de “bola parada” são decisivas em algumas partidas, principalmente naquelas mais equilibradas sob o ponto de vista da criação de oportunidades de gol. Treinadores, jogadores e jornalistas quase que diariamente atribuem a vitória desta ou daquela equipe para esse fator.

O que chama atenção é que, mesmo se preparando para esse momento, as equipes continuam sofrendo gols em boa quantidade, independentemente do tipo de marcação adotado.

Basicamente são três tipos de marcação utilizados para o escanteio:

- Marcação individual: cada jogador marca um adversário até o fim da jogada.

- Marcação em zona: são determinadas áreas de atuação para cada marcador que objetiva ter controle sobre a zona que é responsável

- Marcação mista: utilização das duas formas de marcação anteriores simultaneamente.

Figura 1 – Marcação mista da defesa do Palmeiras

Na figura acima, vemos um jogo do Campeonato Paulista sub-17 (juvenil) entre Ponte Preta e Palmeiras. O Palmeiras optou por uma marcação mista, com um atleta no “primeiro pau” (em zona), outro no bico da pequena área (em zona) e o restante marcando individualmente o ataque pontepretano, inclusive no rebote.

Esse tipo de marcação é utilizado por várias equipes, com variações do número de atletas “em zona” e marcando individualmente.

A forma como é treinada a marcação dos escanteios pode nos dar uma pista do motivo para o insucesso da defesa, pois na maioria das vezes não simula a situação de jogo em que parte-se de uma desorganização para uma rápida organização (poucos segundos). Comumente no treino, inicia-se a jogada já com o escanteio a ser cobrado e os defensores posicionados em seus respectivos lugares. Para completar há muitas interrupções para correções, não exigindo que o atleta se concentre de forma mais prolongada.

Como alternativa, poderíamos realizar o treino da seguinte forma:

- orientar os atletas sobre o posicionamento desejado antes do exercício

- colocá-los ainda em situação defensiva com bola em jogo

- jogar a bola para escanteio

- bater em menos de 12 segundos

Essa atividade pode ser realizada em 5 blocos de 3 minutos com intervalos de 1 minuto para rápida correção de posicionamentos. Fundamental para manter a concentração dos atletas é cobrar metas para a atividade (X gols em y escanteios, por exemplo).

Leandro Zago

Marcação individual, por zona, mista e híbrida

Afinal, qual delas é melhor? Será que existe a melhor? Entrar em consenso sobre o tema parece ser algo ainda muito distante, visto que, é mais do que um debate sobre o jogo, é um debate que envolve questões culturais. Quando buscamos uma compreensão do futebol sob a perspectiva da complexidade devemos nos apropriar de todas as áreas de conhecimento relacionadas ao ser humano. Ou não?

Vejamos, nos campeonatos nacionais do Brasil e de Portugal grande parte das equipes joga utilizando marcação mista com marcações individuais em alguns casos dependendo da qualidade do adversário. Em Portugal costumam chamar isso de “jogo de pares”, onde cada jogador marca o adversário que jogar em sua região (não podemos confundir com zona) e um sobra, com as duas equipes buscando o encaixe e anulação do jogo do rival. Muito próximo do que vemos nas equipes brasileiras.

Em contrapartida, na Inglaterra, Itália e Espanha, por exemplo, as grandes equipes jogam marcando por zona, com variações nas plataformas de jogo de acordo com a proposta de determinada partida.

A marcação híbrida, caracterizada pela presença das outras três, dentro de um mesmo modelo de jogo, de forma padronizada, exige um nível de coordenação muito alto, portanto poucas equipes se dispõe a utilizá-la. Caso não esteja bem incorporada pelos atletas gera um estado de confusão nas trocas constantes. O Manchester United da temporada 2006/2007 utilizou-a em alguns jogos.

Por que tantas variações na forma de marcar? Porque cada uma tem os seus prós e contras em cada situação do jogo.

O conhecimento do treinador sobre o jogo fará toda a diferença na hora de optar por essa ou aquela. Se propuser a marcação individual, sua prioridade é anular o adversário, jogar em função deste. Caso escolha marcar por zona, o foco do treinador é na sua própria equipe primeiramente, criar superioridade numérica em várias regiões do campo e fechar zonas de risco principais.

Voltando ao início desse texto, a pergunta: descobrimos a melhor?

Para o leitor pensar sobre o assunto, analise os casos abaixo baseado na forma de marcação das equipes:

- São Paulo (mista) e Internacional (mista / individual) campeões do mundo contra Liverpool (zona) e Barcelona (zona) respectivamente;

- Boca (zona) campeão da Libertadores algumas vez contra equipes brasileiras (mista);

- Internacional (mista) campeão do Torneio de Dubai contra a Internazionale de Milão (zona) e

- França (zona) elimina Brasil (mista) da Copa de 2006.

Já decidiu?

Leandro Zago

Defesa “com sobra” e o posicionamento do goleiro

Muito comum nas equipes que jogam com marcação mista é definir um de seus zagueiros para jogar “na sobra”, ou seja, este não acompanha nenhum atleta do adversário, mas é responsável por realizar as coberturas necessárias na linha de defesa. Em algumas equipes esse jogador é fixo, em outras ele é definido a cada jogada dependendo do posicionamento dos atacantes adversários.

Além da realização das coberturas, este jogador também cria uma superioridade numérica garantindo a presença de um defensor a mais nos ataques ou contra-ataques adversários. Olhando para a figura abaixo, podemos reparar que a forma como essa equipe posicionou o homem da sobra não criou uma superioridade numérica de 3 X 2, mas de 1+3 X 2, afinal o goleiro é parte integrante da equipe e deve participar ativamente de toda a estrutura tática.

Figura 1 – Posicionamento da defesa (verde) durante uma seqüência ofensiva

Vamos discutir alguns pontos apresentados na figura:

- há muito espaço entre a defesa e o restante da equipe, visto que não vemos nenhum outro atleta de verde até a linha média. Com isso a compactação da equipe fica prejudicada.

- o zagueiro central está sobrando em linha e o goleiro muito próximo a sua meta. Essa superioridade de 1+3 X 2 gera uma inferioridade no ataque de 7 X 8+1.

- os dois zagueiros que estão marcando os atacantes adotaram estratégias diferentes. Enquanto o zagueiro do lado direito optou por marcar de uma forma mais zonal, “por dentro”, priorizando o controle do espaço, o zagueiro do lado esquerdo buscou a marcação individual, anulando o adversário em detrimento do espaço. A falta de um padrão muito bem definido gera falhas em momentos onde as decisões devem ser coletivas.

Como solução, poderíamos adiantar o zagueiro “da sobra” de forma que formasse um triângulo com o vértice apontado para frente em relação com os outros dois. O goleiro também se adiantaria até a “meia lua” da área empurrando esse triângulo de zagueiros mais à frente. Assim, aumentaríamos um jogador por trás da seqüência ofensiva (conseqüentemente melhoraríamos a ocupação espacial em campo adversário), manteríamos a “sobra” com o goleiro e posicionaríamos os dois zagueiros “por dentro” em relação aos atacantes, para que, em caso de um longo lançamento no contra-ataque vá para zonas laterais e a defesa se reorganize.

Leandro Zago