quinta-feira, 24 de abril de 2008

Liga dos Campeões 07/08: Barcelona 0 X 0 Manchester United

Em partida disputada no Camp Nou, Barcelona e Manchester United não marcaram gols e adiaram a decisão para o segundo jogo na Inglaterra. Aos dois minutos de jogo o Manchester teve a seu favor um pênalti depois que a bola bateu na mão do zagueiro Milito. Cristiano Ronaldo bateu para fora desperdiçando uma oportunidade de abrir vantagem para o jogo da volta.

Frank Rijkaard utilizou a plataforma 4-1-3-2 com alternância para a 4-1-2-3 nos ataques posicionais através da abertura de Iniesta como um atacante pelo lado esquerdo. Alex Ferguson montou o Manchester na plataforma 4-4-1-1, marcando na intermediária defensiva. Ambas equipes usaram a marcação híbrida, ou seja, alternando, de acordo com a situação características da marcação individual e zona.

Figura 1 – Barcelona (laranja) sem bola

Mesmo tendo ficado com a posse de bola quase o dobro do tempo do Manchester (64% contra 36%), o Barcelona alterou um pouco sua forma de jogar colocando três jogadores à frente de Touré (5) em seu setor de meio de campo (figura 1). Após a recuperação da bola, Iniesta (8) entrava como terceiro atacante, dando amplitude ao ataque pelo lado esquerdo, fazendo com que a equipe circulasse a bola da maneira que está habituada. Porém, esse desenho (figura 2) não permitia jogadas individuais por esse lado pelas características do atleta, concentrando o jogo espanhol todo em Messi (11) do lado direito até o momento da sua substituição.

Figura 2 – Barcelona buscando a profundidade ofensiva

Pela disposição espacial, podemos observar que dois jogadores do Manchester tinham funções além daquela que é flutuar com a equipe. Evra (6) não acompanhava a flutuação à direita da sua equipe, marcando Messi com proximidade. Tévez (9) aproximava-se de Touré (5) sempre que o Barcelona recuperava a bola, ou marcando individualmente ou fechando linhas de passe para esse jogador. O ala Park (11) quando necessário recuava um pouco ocupando o espaço na linha de defesa deixado pela opção em marcar individualmente Messi.

Ferguson mostrou estar correto nas opções adotadas, pois, foi à Espanha e trouxe um resultado interessante para decidir em casa. O maior volume de jogo do Barcelona não foi traduzido proporcionalmente em reais chances de gols, sendo a melhor oportunidade para marcar o pênalti desperdiçado por Cristiano Ronaldo.

Leandro Zago

terça-feira, 22 de abril de 2008

Periodização Tática e Futebol

"Aspecto particular da programação, que se relaciona
com uma distribuição no tempo, de forma regular,
dos comportamentos tácticos de jogo, individuais
e colectivos, assim como, a subjacente e
progressiva adaptação do jogador e da equipa
a nível técnico, físico, cognitivo e psicológico".
(MOURINHO, 2001)

A definição acima dada pelo treinador português José Mourinho sobre o seu conceito para a periodização contempla o que para ele são os quatro aspectos fundamentais que o treinamento deve abranger de uma forma indissociável. Defende que toda sessão de treino deva ser realizada com bola de forma que o atleta pense no jogo. Para Carvalhal (2003) a primeira preocupação nessa periodização é o jogo, com ênfase em treinos situacionais e em situações de jogo, com o treino físico (ou da dominante física) inserido no mesmo.
Essa forma de periodizar é contrária aos modelos tradicionais, em que as prioridades do treino são outras; em que os aspectos físicos, técnicos, táticos e psicológicos possuem sessões particulares de trabalho, sendo em alguns momentos “integrados” em treinamentos físico-técnicos ou técnico-táticos que apesar da presença da bola não possuem como objetivo central a melhora da qualidade do jogo.
Considerando como epicentro do jogo o aspecto tático, a Periodização Tática (PT) citada pelos treinadores acima tem como referência o Modelo de Jogo Adotado (MJA) e, com isso, os outros aspectos devem estar presentes sempre nas sessões de treinos, pois sem eles o jogo em alta qualidade torna-se fora do alcance. A tática é pensada como aspecto central da construção do treino, de forma que as outras capacidades sejam desenvolvidas por “arrasto”, de forma contextualizada e identificada com a matriz de jogo proposta.
Para isso nas sessões de treino são desenvolvidos exercícios que construam e potencializem a forma de jogar exacerbando algumas situações (princípio metodológico das propensões) que o treinador eleja como prioridade naquela sessão.
Dentro da PT não faz sentido um mesociclo apoiado em microciclos que tenham em sua estrutura perspectivas praticamente idênticas pautadas ou na variação de volumes de carga, ou de prioridades físicas, ou nas pendências fisiológicas. Na perspectiva do MJA, o microciclo segue uma progressão complexa relacionada ao processo e compreensão da lógica do jogo e ao modelo de jogo a se jogar.
A Periodização Tática emerge, na prática competitiva (principalmente em Portugal nesse momento), como uma nova proposta de periodização para os jogos coletivos, respeitando suas características – e nesse caso aprofundando nas particularidades e complexidades do futebol. Surge como alternativa para a periodização tradicional que têm, em grande parte de seus idealizadores, origem em esportes individuais ou com um curto período competitivo. Parte do pressuposto de que esportes coletivos, como o futebol nesse caso, com longos períodos de competição necessitam de regularidade competitiva, não tendo nos “picos de forma” esse objetivo atingido. Os picos do Modelo de Jogo tornam-se as metas a serem buscadas e que, pelos constantes processos de construção do mesmo proporciona um desenvolvimento contínuo.
Para pesquisadores e profissionais da Educação Física, PT e MJA não são nenhuma novidade, longe disso. Autores clássicos estudados em boas faculdades de Educação Física no Brasil propõem discussões nessa perspectiva há mais de 20 anos. A novidade talvez seja vê-la realmente na prática desportiva do futebol de alto nível.
A PT mostra uma preocupação com a qualidade do jogo e rompe com conceitos cartesianos fincados em nossa sociedade. Seus conceitos, idéias e perspectivas passaram agora pelos portões das universidades, rumo a batalha contra os achismos que ainda imperam no futebol (ou por tradicionalismos ou pela falta de conhecimento científico).

Referências Bibliográficas
Carvalhal, C. (2003), "Periodização táctica. A coerência entre o exercício de treino e o modelo de jogo adotado" Documento de apoio das II Jornadas técnicas de futebol da U.T.A.D
Mourinho, J. (2001), "Programação e periodização do treino em futebol" in palestra realizada na ESEL, no âmbito da disciplina de POAEF.

Leandro Zago - CIEFuT

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Scout e suas ferramentas complementares

Imagine que você, treinador de futebol, queira obter o máximo de informações possível sobre uma equipe (a própria ou uma adversária) com o intuito de potencializar sua performance e conseqüentemente os resultados obtidos. É fundamental a coleta de dados para a estruturação de um Scout quantitativo e qualitativo que ofereça um “mapeamento” espacial e temporal das tarefas que foram realizadas por determinada equipe. Para contextualizar esses dados devemos sempre considerar a proposta de jogo da equipe analisada, afinal, um time que marca intensamente em campo adversário apresentará números diferentes de outro que opte pela marcação em bloco baixo. Caso essa contextualização dos relatórios construídos seja feita de forma empírica, abre espaço para o “achismo” e a “opinião pessoal” jogando por água abaixo todo o processo científico que estava sendo transcorrido.

Então podemos afirmar que, apesar dos grandes trabalhos que são realizados por algumas empresas de scout, que cumprem em 100% a que se propõe, com grande qualidade do serviço e sempre buscando a excelência através da criação de novos serviços e aprimoramento dos já existentes, essa ainda é uma ferramenta incompleta, com algumas lacunas que deixam margem para que sejam incompreendidas e mal utilizadas.

E essa lacuna é um caminho ainda pouco explorado pelos profissionais do futebol, pois entra num campo onde a subjetividade ainda é aceita como possível verdade. Para que consigamos contextualizar a ação temos como fonte única a observação dos resultados apresentados. Mas se nos apegarmos aos resultados pontuais simplesmente cairemos no campo do scout qualitativo, o qual estamos tentando tornar mais fiel e não substituir.

Considerando que estamos a analisar um sistema complexo (o jogo), com interação entre um número altíssimo de variáveis podemos partir do princípio de que a seqüência de eventos aleatórios ocorridos na partida pode nos dar pistas num primeiro momento que serão confirmadas posteriormente caso venham a se repetir de forma semelhante em uma determinada quantidade. Uma finalização da entrada da área é um dado, dez finalizações dessa zona é um outro tipo de dado e saber que oito dessas dez finalizações tiveram origem em jogadas com bolas recuperadas nas mesmas zonas do campo com os mesmo atletas participando da jogada é um dado muito mais rico.

Para detectarmos essas variáveis, primeiro precisamos saber em que nível hierárquico elas influenciam no jogo e qual a relação que mantém com o mesmo. Estruturá-las é preciso para sabermos se pertencem a Lógica do Jogo, ou seja, são inerentes a qualquer jogo, se são Princípios Operacionais de Ataque (POA) ou de Princípios Operacionais de Defesa (POD) ou se são Princípios de Jogo.

Com isso, os padrões comportamentais individuais ou coletivos podem ser organizados de forma complementar com os dados de um scout para que a fidedignidade de uma constatação e a posterior resolução de um problema ou potencialização de uma qualidade estejam o mais próximo possível da exatidão, ou que pelo menos caminhe para ela.

Leandro Zago

O “o quê?”, o “como”, o “treino” e a “tática”

A estrutura básica de uma comissão técnica de uma equipe profissional vem se tornando cada vez mais numerosa pelas novas necessidades do futebol. Nos atendo apenas aos profissionais que estão envolvidos no “trabalho de campo” diretamente temos:

- Treinador

- Auxiliar Técnico

- Preparador Físico

- Auxiliar de preparação física (não em todos os casos)

- Treinador de goleiro

Olhando para a relação acima, na atual realidade do futebol, os únicos que chegam no esporte pelo caminho acadêmico são o preparador físico e seu auxiliar. Os outros cargos normalmente são ocupados por ex-jogadores. E essa configuração talvez explique a aplicação dos grandes avanços obtidos em áreas como a fisiologia e bioquímica do exercício, a biomecânica entre outras. Não que estejamos no nível ideal, mas no caminho para ele. Ainda dentro de uma visão fragmentada e fragmentadora do conhecimento, cabe ao treinador e seu auxiliar deter informações relacionadas à tática (e não a “dominante” tática integrada com outros aspectos) e os meios para que sua equipe a assimile e automatize alguns padrões.

Por ter toda uma carreira geralmente construída na base experiência e no modelo jogador-executor, o ex-jogador e agora treinador precisa criar alguns hábitos que se fazem importantes nesse novo período de sua vida. Um deles é estudar sobre os temas que cercam sua nova profissão para que se torne um profissional capaz de adquirir novos conceitos, repensar a prática atual aplicada e construir novos conhecimentos.

Pensando no trabalho do dia a dia, fica mais explícita ainda essa necessidade, pelos desafios que vão surgindo. Imaginemos uma situação problema: a equipe A não realiza contra-ataques com freqüência mesmo em jogos com possibilidade para isso. O que fazer? Como trabalhar isso no treino? Abaixo seguem as soluções de determinados treinadores:

- o treinador 1 passou essa sua impressão aos jogadores na reapresentação após o jogo e cobrou que eles realizassem saídas em velocidade no coletivo sempre que recuperavam a bola. Gritava com os atletas quando não ocorria o que foi pedido;

- o treinador 2 , respaldado por um scout quantitativo, apresentou uma resposta parecida com o treinador 1, mas pediu ao seu preparador físico que aumentasse a carga de trabalho de aceleração e força explosiva como complemento;

- o treinador 3 identificou através de um scout qualitativo que assim que roubava a bola sua equipe perdia rapidamente por problemas no jogo posicional e demora na transição ofensiva, mostrando aos seu jogadores o problema através de vídeos editados e debatendo as possíveis soluções em uma reunião e;

- o treinador 4 realizou todo o processo do treinador 3, mas embasou a busca de soluções no trabalho de campo, com atividades que apresentavam as situações problema do jogo em uma densidade alta para que as respostas que fossem surgindo aumentassem as possibilidades de soluções da sua equipe. Nas atividades, por arrasto, as capacidades físicas eram treinadas num contexto motivante de novas descobertas e a capacidade técnica de cada atleta era uma ferramenta para se atingir determinados objetivos.

Para que o treinador possa aumentar as possibilidades de resposta dos seus atletas é imprescindível que ele aumente as próprias primeiro, dominando áreas do comportamento humano e da pedagogia do esporte. Essa flexibilidade dará a ele (treinador) uma gama maior de soluções para os eventos que se sucedem, adaptando-se melhor as diferenças comportamentais dos seus jogadores, da sua comissão, enfim, de todos os envolvidos no processo. Simultaneamente à escolha de ser treinador, escolhe-se ser cientista, psicólogo, pedagogo, filósofo e acrescente o que mais julgar necessário para o cargo. O futebol precisa mais de profissionais do que de técnicos, que apenas reproduzem procedimentos. E se você tem a intenção de se tornar um treinador, e realmente gosta de futebol já sabe como pode colaborar, e muito, com ele.

Leandro Zago

Uma visão limitada da marcação

É muito comum ouvirmos os treinadores falarem em sistemas de marcação, ou como a equipe deve anular o oponente, e que em determinada partida ele optará por tal sistema de jogo por considerá-lo mais eficiente para marcar adversário e garantir um resultado. E a questão que aparece nesse momento é se todos eles estão perspectivando a marcação com os mesmos princípios. Muito normal um treinador de terceira divisão vê-la de forma diferente de um de primeira divisão, é uma questão de nível de elaboração quanto à proposta de jogo. Também devem apresentar diferenças um treinador que adota marcação mista e um outro que prefira marcar por zona, já que ambas possuem na sua essência diferentes referenciais. Alguns autores escreveram sobre o tema.

Lópes Ramos (1995) diz que a marcação é uma ação tática dos jogadores da equipe que está sem a bola realizam sobre seus adversários, evitando o contato desses com a bola ou de o fazer nas piores condições possíveis. É realizada sobre todos os adversários com ações diferentes sobre o portador da bola, sempre com o marcador entre o adversário e a própria baliza, orientado em relação ao seu par. A marcação deve ser tanto mais forte quanto mais próxima ao gol defendido. Pacheco (2001) define marcação como uma ação tática em que os defensores aproximam dos atacantes, colocando-se entre eles, a bola e o gol defendido, impedindo a progressão, o passe e a finalização, buscando a recuperação da bola.

Reparem que essa duas definições para marcação colocam o adversário como referência primária para a marcação. O objetivo principal (e provavelmente único) é evitar qualquer ação do mesmo. E mostra-se como único porque não apresenta nenhuma relação com a forma de jogar da equipe que está marcando, que apenas quer impedir o jogo do outro time. Não apresenta porque todas as ações citadas pelos referidos autores são individuais. O time marcador corre atrás do time que joga, deixando de impor sua própria forma de jogar, desprezando uma ocupação espacial racional. Considera a marcação com um momento estanque, dissociado dos quatro grandes momentos do jogo (sem bola, transição defesa-ataque, com bola, transição ataque-defesa).

Quando “Lópes Ramos” escreve “a marcação deve ser tanto mais forte quanto mais próxima ao gol defendido” essa proposta torna-se ainda mais limitada, pois desconsidera a possibilidade de se realizar pressão sobre o adversário em zonas mais adiantadas. Em nenhum momento o sistema de coberturas é colocado como uma possibilidade, afinal, os marcadores nunca saberão onde estarão seus companheiros de equipe que nesse momento estão na dependência do “seu par”.

Sob essa perspectiva, o jogo passa a ser visto de uma forma fragmentada onde suas partes não se relacionam nem se interagem. E, ao assistir uma partida de futebol em qualquer nível podemos constatar que os quatro momentos citados anteriormente ocorrem o tempo todo, em sucessão e com conseqüências um do outro. O treino deve considerar essa interação, porque querendo ou não o treinador, o jogo será construído dessa forma.

- Referências Bibliográficas

LÓPEZ RAMOS, A. (1995). El marcaje: Fundamentos y trabajo práctico. Fútbol: Cadernos Técnicos, Nº 1, abril de 1995. 3-14.

PACHECO, R. (2001). O Ensino do Futebol de 7 – Um jogo de iniciação ao futebol de 11. Edição do autor.

Leandro Zago